A manta começa a ser destapada e, hoje, o cérebro humano tem menos segredos. A ciência pula e avança, graças às imagens relevadas pela ressonância magnética

Escolhemos o exemplo de António Damásio, apenas porque é um português e neurocientista de renome mundial que se tem dedicado ao estudo da mente, particularmente à importância das emoções na nossa vida. António Damásio não “entrou” no cérebro dos seus pacientes para perceber o seu funcionamento e o peso da emoção ou da razão, mas espreitou para dentro dele. Utilizou as imagens recolhidas pela ressonância magnética para estudar a estrutura e função do cérebro, comprovando cientificamente as teorias que criou em modelos existenciais.

A ressonância magnética veio consolidar teorias, mas também acabou por permitir valorizar a emoção, porque se é certo que o nosso cérebro está permanentemente em atividade, recebendo, processando e emitindo informação, não é menos verdade que esse mesmo cérebro é emoção e razão.

Hoje, é possível provar que também as emoções e tudo o que chega ao nosso cérebro passam por circuitos, identificados nas imagens como a “substância branca”. Esses mesmos circuitos têm que deixar passar corretamente a informação interna e externa para ser processada no córtex, resultando daí uma imagem corporal e do mundo que nos rodeia, que vai sendo construída ao longo do tempo e que é própria de cada um. Desta forma, a razão e a emoção estão intimamente ligadas.

As emoções geram sentimentos como o amor, ódio, tristeza, alegria, vergonha e culpa, influenciando o comportamento, as escolhas e as tomadas de decisões, ditas racionais. Ser racional não é o mesmo que ser desprovido de sentimentos e emoções, uma vez que ambos estão interligados na formação e crescimento do ser individual e social e na tomada de decisões.

Os dois primeiros anos de vida são fundamentais para a criação de redes neuronais adequadas. Crescer significa consolidar e modular essas mesmas redes, num processo que assenta na passagem contínua de informação para o córtex cerebral proveniente dos nossos sentidos. Se é verdade que o QI pouco muda depois da adolescência, a inteligência emocional aprende-se, desenvolve-se e melhora ao longo da nossa vida. A autoestima, a gestão do stress, as aptidões sociais e o controlo da impulsividade, fazem parte do processo de aprendizagem e consolidação do ser individual e social.

Como temos a certeza de tudo isso? Com as imagens em tempo real, hoje reveladas pela ressonância magnética, e que suportam e dão crédito aos trabalhos e investigações realizadas em vastos campos, permitindo, por exemplo, associar defeitos comportamentais e de aprendizagem a lesões de estruturas específicas e que são importantes na regulação das emoções, como o sistema límbico e o córtex pré-frontal.

Além da imagem estrutural, a ressonância magnética também permite a obtenção de imagens funcionais, como a resposta do cérebro a tarefas específicas, como a linguagem e a memória, por exemplo. Para saber ler estas imagens, é necessário perceber e descodificar as diferenças regionais da microcirculação que é mais solicitada nas zonas funcionais ativas.

Não podemos deixar de sublinhar o valor acrescentado que a tratografia veio dar à ressonância magnética, mais recentemente. Esta é uma técnica avançada, associada à ressonância magnética está hoje a abrir caminho a novos estudos, novas descobertas e outras tantas confirmações de mistérios do nosso cérebro.

Egídio Machado

(Médico, Neurorradiologista)

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